quarta-feira, 29 de novembro de 2017

QUAL A COR DA TUA COR


         

 Coleta de dados e reflexões sobre as relações étnico raciais na escola

A palavra preconceito está definida no dicionário como “qualquer opinião ou sentimento concebido sem exame crítico”. Todos nós, de uma maneira ou outra, somos desafiados a trabalhar a questão do preconceito em nossas escolas. Na EMEI Tio Barnabé, não é diferente. Constantemente surgem ações, questionamentos, situações, revelações e constatações de que as crianças não são e não estão imunes aos preconceitos.
Na turma de M2, onde trabalho atualmente, ao percebermos a intricada relação de baixa autoestima, de falta de identidade e de conflitos nas relações étnico raciais, optamos por trabalhar com as crianças no sentido de valorizar a diversidade. Por isso, não esperava que o censo escolar sobre o dado cor/raça, mostrasse completamente a real identidade racial das crianças, mas o resultado encontrado pelo levantamento feito junto às famílias trouxe uma discrepância muito grande, ainda maior do que eu esperava.
Não são apenas as crianças têm baixa autoestima em relação a sua cor, mas suas famílias também. O quadro abaixo revela a imensidão do problema: Dos 125 alunos matriculados na escola, apenas 8 são declarados como sendo da cor negra. As famílias declaram 104 crianças como brancas, 10 como pardas, nenhuma como indígena, nenhuma como amarela, uma família optou por não declarar a raça/cor da criança e há ainda uma, que identifica a criança como qualificação não declarada.

                       QUAL A COR DA TUA COR         

O censo revela: 83% das famílias declaram suas crianças como brancas e apenas 6% declaram seus filhos como negros. A diferença entre aquilo que é declarado e a realidade é enorme. Vejamos os dados da turma do M2 declarados pelos familiares das crianças no quadro acima. Das 21 crianças matriculadas, 20 foram declaradas como brancas e uma não teve a cor declarada pela família. O preconceito não está apenas na família, nem é apenas repetido na escola ou na sociedade, o preconceito está internalizado na criança como pudemos mais uma vez constatar durante nossas rodas de conversa sobre o assunto. O diálogo constante sobre a cultura e origem familiar contribuiu para a elaboração de um novo quadro, desta vez, estruturado pela visão das crianças, das famílias e da professora. 

Etnia
Dados da Ficha Autodeclarados
 Visão do Aluno/ Atividade em aula
Perspectiva da Professora
Branco
20
18 
13
Negro
0
2
  5
Pardo
0
0
  2
Indígena
0
1
  1
Não declarado
1
0
  0


Os dados obtidos impressionaram não apenas à equipe de trabalho da turma do M2, mas a todos os educadores da escola. São números que nos empurram para discussão e reflexão sobre a realidade atual e sobre nossos futuros projetos em relação a esta questão. Há muito para ser feito sobre as relações étnico raciais na escola e o primeiro passo nesse sentido, está em ter clareza e conhecimento da realidade dos números, que não podem e não devem ser ignorados.

A autoestima que a criança vai desenvolvendo é, em parte, interiorização da estima que se tem por ela e da confiança da qual é alvo. O que fazemos em sala de aula, o que dissemos, o que propomos e o que ignoramos, silenciamos ou negligenciamos em torno dessa questão pode perpetuar preconceitos ou despertar a valorização das diferenças e da autoestima. A construção da identidade é um processo constante que envolve sentimentos sobre como o outro nos faz perceber:

(...)os outros fazem-nos sentir, pelas palavras, pelos olhares, que somos pobres ou aleijados, demasiado baixos ou demasiados altos, escuros ou demasiados louros, circundados, não circundados ou órfãos- estas inumeráveis diferenças, mínimas ou significativas, que traçam os contornos da cada personalidade, forjam comportamentos, as opiniões, os receios, as ambições, que se revelam muitas vezes eminentemente formativas, mas que frequentemente nos ferem para sempre. (MALOUF, 2002, p.35)

REFERÊNCIAS:

SECAD- Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico- Raciais. Brasília, 2016.

domingo, 26 de novembro de 2017

Entre os muros da escola

                       

O cinema está cheio de filmes onde o professor super herói salva os alunos e a escola. Isso não acontece no filme francês “Entre les murs”, de Laurent Cantet.Entre os Muros da Escola” rejeita a versão de final feliz dos filmes hollywoodianos: O professor não é o salvador da pátria escola. Ele não derruba os muros e planta flores entre eles. Porque ele não o faz? Porque ele também é prisioneiro desses muros visíveis e invisíveis que habitam a escola. A inércia na e da escola não é resolvida só com o sujeito docente. Há um mundo inteiro dentro dos muros da escola, uma estrutura complexa e cheia de contradições que envolve sujeitos diferentes: professores, pais, alunos, funcionários, direção e gestão. Contradição talvez seja a melhor palavra para descrever e definir o filme.

Tudo é contradição em entre os Muros da Escola: Transformação X Estagnação; Professores X Alunos; Professores X Professores; Pais X Alunos; Professores e Gestão; Gestão X Todos; Alunos X Alunos; Diversidade X Xenofobia; Cultura X Aculturação; Pensamento X Aprisionamento; Adaptados X Excluídos; Liberdade X Autoritarismo; Questionamento X Desrespeito; Gestão Democrática X Gestão Ditadora; Sujeito X Sujeito. Isso mesmo: Sujeitos contra sujeitos. Os sujeitos esbarram nesses muros levantados, esbarram entre si e em si mesmos, esbarram em seus espaços e nessas contradições criadas pelo sistema e mantidas por toda a comunidade escolar. É um círculo vicioso onde todos já sabem o final.

A escola é mostrada como uma repetidora da desigualdade e dos preconceitos em todos os níveis, onde a educação é o que menos importa, onde aprender e ensinar não vale a pena; onde ninguém parece acreditar em nada ou querer lutar por um ensino de qualidade, onde os pares discentes não se entendem, onde se divide ao invés de somar, onde os diferentes convivem mas não são reconhecidos, onde a educação ganha escala industrial e não há lugar para os excluídos dos moldes, onde obedecer é vital para permanecer, mas questionar é totalmente dispensável e pensar criticamente só atrapalha a engrenagem. 

É chocante ver a escola matando a mudança, a esperança, a aprendizagem, a transformação e a possibilidade do sujeito. O filme nos coloca diante do espelho e do abismo que existe entre a realidade e o que deveria ser. Nos sacode da mesmice que habita entre os muros da nossa própria escola e nos faz refletir sobre nosso papel como educadores, porque a imagem refletida no espelho do filme volta. Não está lá, mas aqui. Entre os muros da escola é um convite para pensar na escola que somos e na escola que podemos ser. Refletir, como o silêncio que antecipa as revoluções, pode ser o início da derrubada dos muros.

REFERÊNCIAS:

Entre les murs, de Laurent Cantet. Disponível no You Tube: https://www.youtube.com/watch?v=rBXlPg7nj-Y&feature=youtu.be

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

À Sombra Desta Mangueira

                                            
À Sombra Desta Mangueira: Uma Reflexão Sobre Dialogicidade

"...Os educadores verdadeiramente democráticos não estão - são dialógicos."
                                                                                               (Paulo Freire)

                                                                


O trecho do livro “A Sombra Da Mangueira”, de Paulo Freire, proposto pela interdisciplina de Filosofia na Educação, nos fala o conceito de Dialogicidade de forma mais intensa e significante: Na relação dialógica como prática da vida humana e democracia e também do diálogo como uma exigência epistemológica, o que nos leva a refletir sobre a distância entre as práticas educativas e o exercício da curiosidade epistemológica.
E porque o mestre Paulo Freire evidencia esse conceito prático de existência humana e educação? Porque educação é busca, inquietação e curiosidade. Ser curioso faz com que aprender seja buscar respostas e é nessa busca que os conhecimentos podem ser adquiridos. Sem curiosidade não há busca e sem busca pelas respostas às suas dúvidas, o aprendizado do aluno não é efetivo, não acontece de fato, não se concretiza como algo realmente adquirido.
É através do diálogo que o professor consegue despertar o sentido do interesse pelas coisas do mundo. Esta dialogicidade independe da política, pois dialogar é antes de tudo humano e opção democrática de quem educa. Como se dá então, essa relação dialógica entre professor e aluno? A raiz da dialogicidade se encontra e se alicerça no diálogo, em seu sentido mais amplo: Na relação do eu com o outro e na relação que estabeleço comigo mesmo. Pensar assim é afastar-se da educação autoritária.
Se o professor opta pelo autoritarismo e pela educação tecnicista o que importa não é a busca, mas os resultados obtidos através de velhas formas de ensinar, de avaliar e dos conteúdos decorados. Este professor mata o desejo de saber e aprender impedindo a aprendizagem em sua plenitude. Nessa educação pronta, plastificada, sem possibilidade de pergunta, de criatividade, de senso crítico e de possibilidades não cabe a democracia.
Dialogar é abrir uma porta de comunicação e manter a porta aberta durante o processo educativo porque aprender é troca de saberes. Na educação dialógica, o conhecimento é construído por alunos e educadores. Essa relação de aprendizagem construída de forma coletiva soma os saberes do aprendiz e do mestre. Essa compreensão do mundo pelo outro e com o outro, expressa uma forma de ver e compreender o mundo de forma mais plena, dinâmica real e sensível, tornando possível a construção de um mundo onde a educação, a esperança e a liberdade caminhem juntas como professor e aluno.

REFERÊNCIAS:

FREIRE, Paulo. À Sombra Desta Mangueira. Editora Olho d’ Água. São Paulo, Fevereiro, 2000.

domingo, 12 de novembro de 2017

Uma porta de comunicação

            Imagem relacionada       

Nossa última aula do curso "A constituição do Sujeito: Psicanalise e Educação", foi ministrada no escuro pela professora Simone Bicca, mas a falta de energia não impediu a aprendizagem e o diálogo. Começamos discutindo sobre Édipo, neuroses, psicoses e paranóias e terminamos conversando bastante sobre o autismo e sobre nossas relações com as diferentes situações que vivemos e enfrentamos em nossas escolas. Não há explicação para o autismo e não há solução mágica para o autismo. No entanto, por tudo que conversamos e vivenciamos, por nossas experiências compartilhadas, fica claro que pode haver um caminho, uma ponte de comunicação, que pode ser estabelecida por infinitas maneiras e formas. Também me chama a atenção o fato de que a criança pode estabelecer vínculo e comunicação com quem e da forma que menos se espera (objeto, animal, pessoa), o que me faz lembrar da afirmação da professora Simone sobre o fato de que somos mais escolhidos do que escolhemos. Fiquei emocionada com o depoimento da colega que falou sobre o aluno da chave e de como a professora usa esse recurso para comunicação e entendimento e com o caso do aluno que pensa ser Barth Simpson e acredita estar estudando em Springfield, em que a professora não rompe esta ponte, mas entra nela. Existem diferentes casos e situações e o que vale para um, não serve para outro, mesmo porque os sujeitos são únicos, como aprendemos constantemente neste curso e as relações nas escolas e com nossos pares também...  Assisti há muitos anos um filme sobre um garoto que estebelece uma ponte de comunicação com um cachorro.Está disponível no you tube.

Um Amigo Inesperado

Também pesquisando sobre filmes e autismo encontrei este documentário incrível LIFE ANIMATED, que conta a história de Owen Suskind, um jovem autista, que tem problemas de fala e utilizou filmes infantis da Disney para conseguir se comunicar de um jeito que encanta. Olha aí o desenho animado usado como ponte.

Life Animated


Interessante também é perceber como tudo o que estamos aprendendo neste semestre se relaciona nessa aprendizagem infinita sobre a diversidade humana. A reflexão e a sugestão de filmes se encaixam em tudo que estamos aprendendo em Educação de Pessoas com Necessidades Educacionais Especiais, interdisciplina que nos leva a refletir sobre nosso papel como professores atuantes de inclusão que não deve e não pode ser o da passividade, mas o da possibilidade, assim como a porta de comunicação com o autista. O discurso de Owen no final do documentário "Vida Animada", mostra que não é verdade que os autistas não gostam de contato com outras pessoas, como muita gente pensa, eles só não sabem como se relacionar. Fica aqui a sugestão do filme e a proposta para reflexão de nossas práticas com a inclusão.

domingo, 5 de novembro de 2017

Perguntar não é responder


A interdisciplina de Desenvolvimento e Aprendizagem Sob o Enfoque de Psicologia II nos tira da nossa zona de conforto como alunas espectadoras e ouvintes para o desafio da prática do que se aprende nos bancos do PEAD. A proposta é a aplicação do Método PIAGETIANO. Estamos todas envolvidas nessa tarefa que vai nos exigir estudo e conhecimento das regras de aplicação tão conhecidas e descritas, mas nunca dominadas por completo por ninguém, nem mesmo por Piaget, posto que a criança é vida e nos surpreende a todo o instante. Não é um método para obter resultados exatos, mas para obter resultados únicos, como único é o sujeito.
Piaget (1926) nos diz que para que o método dê resultado, é preciso regulá-lo por meio de controle e por regras, que atuem na forma de fazer e interpretar a pergunta. Devemos evitar a sugestão da palavra e a regra. É necessário ao pesquisador “[...] conhecer a linguagem infantil e formular as perguntas nessa mesma linguagem [...]” (Piaget, 1945, p.15)
A forma de o pesquisador perguntar é essencial, provocando na criança a necessidade de explicar a sua resposta. Isso evita uma série mecânica de perguntas parecidas;  É importante um clima agradável, livre de interferências externas; A aplicação piloto do método para verificar a coerência do método com o objetivo; A  relação de tranquilidade estabelecida para a criança com linguagem adequada do aplicador; A quantidade de perguntas também adequadas à idade da criança; A qualidade das perguntas feitas; A precisão do problema a ser investigado pode ter variáveis que podem ajudar ou atrapalhar a pesquisa; A prática do método e a reflexão da aplicação após a apreciação de uma entrevista filmada e transcrita são fundamentais; O educador deve valorizar as respostas do sujeito e sua forma de pensar acima dos resultados.
A interferência do professor, deve ser mais estimuladora e provocadora do que direcionada a obter determinada resposta ou resultado. Mais do que perguntar neste caso, é fundamental saber “como perguntar”.  Eis aí nosso maior desafio, aprender a perguntar, pois que a pergunta não deve ser a resposta, deve ser simplesmente o que é: a pergunta. 

Referências: 
MARQUES, Tânia B. I. Método Clínico Piagetiano. Exemplo de Transcrição
MARQUES, Tânia B. I. Sobre a aplicação das  provas operatórias.